Sem limites



Escolhi abraçar o mundo.
Aos 19 anos entendi que não pertencia a lugar nenhum. Minha vida se resumia a não ter limites. Tendo o firmamento como casa, segui meu destino.
Sai de Ourinhos deixando lágrimas nos olhos dos meus pais. Deixei os amigos, os livros, o aconchego... Fui á luta. Em companhia da minha arte, passei por diversas cidades de São Paulo e cheguei a Floripa.
Lá encontrei um amigo, de 18 anos, que fez o mesmo que eu: abraçou o mundo. O frio nos castigou muito e nos deu uma nova meta: seguir para um lugar mais quente... Vamos para Bahia.
Quando o coração aperta, volto para casa e ganho beijos de mãe e abraços de pai. Confesso que os últimos já fazem dois meses, mas, quem sabe em breve eu não passe por lá.
Para falar a verdade, não acredito em Deus, nunca acreditei, mas alguém cuida de mim, pois nunca passei fome, nem pedi esmola. Minhas acrobacias em semáforos e os artesanatos que faço me sustentam. Vez ou outra consigo até pagar um hotel simples para dormir.
Até ontem estava em Sorocaba, uma terra boa com gente de bom coração. Hoje estou em Itu e amanhã, quem sabe... Pensei em passar por São Paulo, mas sofri muito em Osasco, mudei meus planos.



Achava que o ser humano estava podre, mas, nesses dois anos de vida alternativa descobri que a humanidade ainda não chegou ao fundo do poço. Conheci muita gente boa, gentil e agradável, que compreende que nem todo o andarilho é mendigo, bandido ou monstro. E, para provar isso, ontem no ônibus que me levou para Sorocaba, conversei por uma hora e meia com uma jovem estudante de jornalismo, que estava tentando voltar para casa. Ela me disse de cara: “Sabe, eu ralo muito... Moro em Cerquilho, trabalho em Sorocaba e estudo em Salto. Faço de tudo para construir uma vida boa, mas, olho para você que é completamente o oposto de mim e percebo que és muito mais feliz do que eu! Que injusto”. Sorrimos e começamos a conversar... Foi bom dividir uma hora e meia da minha vida com ela, assim como fiz com muitos antes dela e ainda farei com vários depois...
E não é para isso que nascemos: crescer, partilhar, aprender e morrer?


Por Adriane Souza


Dedico este texto para uma pessoa que, infelizmente, nunca irá ler: o andarilho Cris, de 22 anos, que me ensinou muitas coisas numa curta viagem de ônibus.

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